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http://asmontanhasqueosratosvaoparindo.blogs.sapo.pt

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EIS AS MONTANHAS QUE OS RATOS VÃO PARINDO

por muito pequenos que pareçam ser... NOTA - ESTE BLOG JAMAIS SERVIRÁ CAFÉS! ACABO DE DESCOBRIR QUE OS DOWNLOADS SE PAGAM CAROS...

POR DETRÁS DE CADA MURO

09.12.24 | Maria João Brito de Sousa

pieter Bruegel, O Velho, wikipédia triunfo da morte (1).jpg

O Triunfo da Morte

*

Pieter Bruegel, O Velho

(Obrigada, Wikipédia!)

*

POR DETRÁS DE CADA MURO
*


Por detrás de cada muro,

Debaixo de cada pedra,

Há um monstrengo que espreita

Gordo, impassível, seguro,

E que a cada dia medra

More, embora, em fenda estreita
*

 

Estende as disformes narinas

Pra melhor nos farejar

E saber o instante exacto

Em que cruzamos esquinas

Para confraternizar

Bebendo um café barato...
*


Para este drago medonho

Somos facílimas presas,

Basta-lhe abrir a bocarra

E esquecer que sonho a sonho

Crescem as nossas defesas

Contra quem nos lança a garra
*


Se tivesse ouvido um homem

O que disse uma mulher

Que sobre o p`rigo alertava...

Mas fez-se mouco e hoje escorrem

De uma parede qualquer

Despojos seus: sangue e lava
*


Por ora, o monstro preguiça,

Tem-nos por já garantidos

Por isso tanto boceja

Que quando uma voz se atiça

Já não lhe chega aos ouvidos,

Vai esmorecendo, fraqueja...
*


Nenhum dos homens o viu,

Só ela, mulher madura

Capaz de amar mal amados,

Ao sentir um calafrio

Sai à rua a ver se apura

O que a traz em tais cuidados
*


Nada sabe, mas pressente

Que algo de errado se passa

Na rua agora deserta

E mui diligentemente

Entra (in)segura na praça

Quando o mostrengo desperta
*


Ouve, então, um ronco rouco,

A sair da estreita fenda

Onde o monstro adormecera

E faz o eco de um pouco

Uma zoeira tremenda,

Pior que de besta ou fera...
*


Corre a mulher a avisar

Os companheiros de mesa

Do que ali testemunhou

E ninguém quis confirmar:

Nem uma lanterna acesa

Da praça se aproximou
*


Rogava, aflita, a mulher

Que alguém à rua descesse

Antes que o monstro atacasse:

- Mulher, que monstro te quer?

Bebe mais um copo e esquece,

Pode ser que o susto passe...
*


Homem, eu sei o que digo!

Na praça, ali bem defronte,

Esconde-se um monstro, uma fera!

Levanta-te e vem comigo

Até à beira da ponte...

Bem mais arrisca quem espera!
*


Mulher, tu julgas que ouviste!

Foi rabanada de vento,

Talvez cachorros à briga...

- Não julgo, ouvi!, ela insiste,

Mas aquele homem descrente

Só crê na própria barriga
*

 

Depois deu-se o impensável:

O solo abanou, gemeu,

As habitações ruíram,

Nem palmo de terra estável

Sob o negro, negro céu

Do qual os astros fugiram
*

 

Agora, no mundo inteiro,

Perdura a noite maldita

Que as mulher`s adivinharam

Trazer tais monstros ao cheiro

Do sangue e da carne aflita

Dos homens que devoraram
*


Só as mulheres aluadas

Como a tal mulher madura

Capaz de amar mal amados,

Foram à morte poupadas

Embora não à tortura

De ver os seus aos bocados
*

 

E, hoje, em cada cidade,

Cada vila e cada aldeia,

Passeia-se alienada

Uma mulher que a saudade

Tornou dura, amarga e feia,

Mas conservou escravizada
*

 

Pra consolo dos dragões

A quem agrada a presença

De umas tantas mortas/vivas

Sem sonhos nem ilusões,

Sem nada que lhes pertença,

Mas para sempre cativas
*

 

De um rasgo de lucidez,

De uma incerteza certeira

Que tomada por incerta

Deu azo àquilo que lês

Nesta estória inverdadeira

(ou será isto um alerta?)
*

 

Mª João Brito de Sousa

08.12. 2024 - 13.30h
***

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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