OUTRORA
OUTRORA
*
Cheira-me a chá de carqueja
A chão molhado de chuva
E, sob um céu que troveja,
Os ganhões pisam a uva.
*
Amareladas, as folhas
Caem na lama do chão;
Sem clorofila, nem escolhas,
Tarde ou cedo cairão...
*
Numa inventada lareira
Queima a lenha que imagino
Enquanto presa à cadeira
Que me coube por destino;
*
Recordo o bibe bordado
E o casaquinho de lã,
Que mantinha agasalhado
O corpo da minha irmã...
*
Eu, onze anitos já feitos,
Dando-lhe-lhe a papa na boca
E ela, esboçando trejeitos,
Sorrisos me dava em troca...
*
Relembro a manta lobeira
Que aquecia a minha Aurora...
Essa Aurora que da Beira
Viera em tempos. Outrora,
*
Outrora, sim, eram belos
Os outonos que vivi!
Hoje relembro, singelos,
Momentos que não esqueci.
*
Maria João Brito de Sousa - 27.09.2020 - 16.54h
Imagem - Eu ao colo da Aurora, nossa empregada na casa de Algés.