O POETA EM CONSTRUÇÃO - Reedição
O POETA EM CONSTRUÇÃO
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I
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Deixai-o crescer, deixai-o,
que um poeta com talento
faz, do trabalho, argumento
e como qualquer catraio
vê crescer, de Maio a Maio,
compassos que são sustento
do seu corpo em crescimento,
tanta vez sem prévio ensaio
quando a sorte, de soslaio,
lhe dá escória por cimento.
*
II
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Se persiste, há-de crescer!
Sobre os versos que construa
hão-de brilhar sol e lua
quando um dia alguém o ler,
pois tanto traz pra dizer
que não haverá poder
que se oponha a que se instrua
e da força em que se estua
nunca se há-de arrepender!
*
III
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Escava a cama da sapata,
bem funda, que a fundação
demanda a força da mão
e a noção mais do que exacta
de que a tua mão contacta
com a mão que amassa o pão
quando assumindo a função
em função de quem contrata
a mão que escava e que acata
o labor da construção,
*
IV
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Mas ainda à mão que escreve
podes dar a mão sem medos
que também moldam seus dedos,
do que tem, quanto te deve
se a estar contigo se atreve
e, pra ti, não tem segredos,
nem te envolve em vis enredos
que outras tecem quando, em greve,
tua mão bem alto eleve
seu protesto, os teus degredos!
*
V
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Deixa crescer o poeta,
dá lugar à Poesia,
pois também há mais-valia
numa estrofe quando, erecta,
assume a força concreta
e não esquece a teoria!
Jorna a jorna, dia a dia,
exaltada, ou mais discreta,
burila e escava e completa
o que outra nunca ousaria!
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Maria João Brito de Sousa
04.06.2016 - 19.16h
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