CANTANDO COM CAMÕES - XI
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ESPARSA
A uma Dama que lhe mandou
pedir algumas obras suas
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TROVAS
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Senhora, se eu alcançasse
no tempo que ler quereis,
que a dita dos meus papéis
pola minha se trocasse;
e por ver
tudo o que posso escrever
em mais breve relação,
indo eu onde eles vão,
por mim só quisésseis ler;
Depois de ver um cuidado
tão contente de seu mal,
veríeis o natural
do que aqui vedes pintado;
que o perfeito
Amor, de que sou sujeito,
vereis áspero e cruel,
aqui com tinta e papel,
em mim co sangue no peito.
Que um contino imaginar
naquilo que Amor ordena,
é pena que, enfim, por pena
se não pode declarar;
que, se eu levo
dentro n'alma quanto devo
de trasladar em papéis,
vede qual melhor lereis:
se a mim, se aquilo que escrevo?
*
Luís de Camões
***
Resposta de Essa Dama
*
Dai-me tempo, meu senhor,
Porque embora me afirmeis
Que mui crus são os papéis
E mui terno o vosso amor,
Foi aos vossos belos versos
Que entreguei o coração
E agora em contradição
Com sentimentos diversos,
Não sei a quem quero mais:
Por mais sincera que seja,
Não sei se esta Alma deseja
Mais a vós que ao que cantais...
Dizeis a Amor estar sujeito
E eu penso que todos nós
Trazemos Amor na voz
Mas, cantá-lo com preceito,
Sedutor e apaixonado,
Bem poucos mo hão cantado,
E eu gravei-o no meu peito...
Cuidai bem do que pedis:
Pode pender minha escolha
Para um verso numa folha
Em vez de um chá, "vis a vis"...
*
Continuo dividida,
Talvez por me ser mais caro
O poema a que me amparo
Do que trazer-vos à vida...
Ai, por Deus!, que crueldade
Dizer-vos o que que vos disse!
Não me ouçais! É da velhice,
Que é crua sem ter maldade
E mete os pés pelas mãos
Pois nem pés nem mãos são sãos
Perdida a sensib`lidade...
E agora, por mais que doa,
A decisão está tomada:
Plo verso fui conquistada,
Vós podeis voltar pra Goa!
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Mª João Brito de Sousa
19.12.2024 - 14.00h
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A Esparsa de Camões foi retirada
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