CAMINHADA - Custódio Montes e Mª João Brito de Sousa
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CAMINHADA
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1.
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Passa a água fica a pedra
À espera e a sorrir
Com a cara bem lavada
O dia à volta a florir
Calmo cabrito que medra
Com a erva encontrada
Tudo ali uma beleza
Água, flores, a natureza
*
É tão bom vir passear
Junto ao rio e suas margens
Sem ter nada que fazer
Ver estas lindas imagens
Moças lindas a passar
Eu com meus olhos a ver
E com gosto e alegria
Neste belo e claro dia
*
As mágoas não penso nelas
Andar não me dá cansaço
Com este sol radioso
E abertura de espaço
Amplas e largas janelas
Sobre vale tão formoso
E a água sempre a andar
Sempre, sempre até ao mar
*
Também nós em cada dia
Mais um passo se sucede
A caminho do destino
Vereda que não impede
De se ter muita alegria
Desde o tempo de menino
Vida, vida continua
Para eu andar na rua
*
As palavras encontradas
Em continuas caminhadas
*
Custódio Montes
20.3.2025
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2.
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Num andarilho com rodas
No qual me possa apoiar
Ainda dou alguns passos
Muito embora devagar...
Ó corpo, se te denodas
E vences os teus cansaços,
Talvez vás da sala ao quarto
Sem mais dor do que a dum parto
*
Mas às belas caminhadas,
Não voltarás, alma minha,
Pois no estado a que chegaste
Só sentada em cadeirinha
Com as pernas levantadas,
Não vá matar-te o desgaste
Porque a maleita te mina
E tu já não és menina...
*
Mas em si, meu qu`rido amigo,
Não entra mazela alguma
E o Tempo passa-lhe ao lado
Já qu`inda maneja a pluma
Como alguém que traz consigo,
Desde a nascença, esse fado...
Pudesse eu seguir-lhe o passo
Sem tropeços nem cansaço...
*
Usarei estes seus versos
Como bengalas... Talvez
Possa ainda caminhar
Pela serra do Gerês
Ou pelos prados dispersos
Que no caminho encontrar
Nesta viagem fictícia
Que é, pra mim, uma delícia
*
Com tropeço ou sem tropeço,
Por seus versos lhe agradeço.
*
Mª João Brito de Sousa
22.03.2025
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3.
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A pensar que ia sozinho
Nesta minha caminhada
Aqui à beira do rio
Segue-me uma camarada
Devagar, devagarinho
A fazer-me desafio
E então que hei-de fazer?
Tenho que lhe responder
*
Diz-me que não pode andar
Mas vejam o que ela fez
Para fazer companhia
Diz ir até ao Gerês
Mas só a imaginar
Mas dá-me muita alegria
Por tê-la por companheira
Mesmo só dessa maneira
*
Vem de longe, lá de Oeiras
Mas muita pressa não traga
Para poder descansar
Bebe um copo aqui em Braga
Assamos umas alheiras
E podemos conversar
Uma vez e outra vez
Antes de ir para o Gerês
*
Ou então, se preferir
Não vamos logo embora
Ficamos o dia inteiro
E durante essa demora
Nós os dois podemos ir
À senhora do Sameiro
E se ainda fizer luz
Descemos ao Bom Jesus
*
Por cá há muita imagem
E vai gostar da viagem
*
Custódio Montes
23.3.2025
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4.
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Se eu aí chegar inteira
(quase acredito que sim...)
Andarei sempre a seu lado...
Nunca se afaste de mim
Não vá uma ribanceira
Pôr fim ao meu novo fado!
Inda que quase me arraste
Não há quem daqui me afaste!
*
Chegarei toda ensopada
(já o estou neste momento)
E, de alto a baixo, dorida
Pois chicoteia-me o vento
Com a fúria da rajada
Que vem com força incontida:
Dá-me um pouco de descanso,
Vento meu, sopra de manso...
*
Perdida a noção do espaço
Até aqui percorrido,
Já não sei se muito ou pouco
Nem sequer em que sentido
Caminha este corpo lasso...
Só sei que o vento está mouco,
Não ouve ou não quer ouvir
O que lhe estou a pedir...
*
Talvez se eu gritar bem alto
O vento me dê ouvidos...
Já lancei um grito vão
E mais três foram perdidos
Ou mos tomou el` de assalto
Sem pudor nem compaixão...
Mas desistir, não desisto:
Avanço, portanto existo!
*
Com vontade e alguma sorte
Caminharei rumo ao Norte!
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Mª João Brito de Sousa
23.03.2025
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5.
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Venha, venha para o norte
Onde nasceu Portugal
De rei que bateu na mãe
Por se ter portado mal
Ao juntar-se com consorte
E dar-lhe o reino também
É traidora, não te fiques
Chega-lhe Afonso Henriques
*
Nasceu assim o país
E para o sul se espalhou
À procura de tesouros
E a Oeiras chegou
Onde agora é feliz
(…Depois de bater os mouros…)
Local de muita alegria
Onde há mar e poesia
*
Cá no Norte é bem mais frio
Mas alegre este cantinho
Onde tudo é beleza
Como o folclore do Minho
Com danças cheias de brio
Há cozido à portuguesa
Com boas águas e fontes
Nas terras de trás—os-montes
*
Mas em Braga, onde moro
A comida é muito boa
Toda a gente come e bisa
Mais barata que em Lisboa.
Um dos prato que eu adoro
É bacalhau à Narcisa
Comerá até fartar
E seus males vai curar
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Se vier aqui ao Minho
É tratada com carinho
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Custódio Montes
24.3.2025
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6.
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Vou indo, amigo, vou indo...
Já galguei meio caminho
E se não estou enganada
Em breve estarei no Minho
Dando o percurso por findo
Quando a meta for cortada...
Estou, amigo, que não posso
Mover um único osso!
*
Não tivesse eu de dar voltas
E mais voltas pr`alcançar
O meu amigo poeta,
Menos teria de andar...
Se juntar as pontas soltas
Obtenho uma linha recta?
Estou a cair da tripeça
Mas, de andar, ninguém me impeça!
*
Devo ter deixado a Musa
Na consulta de enfermagem...
Ou foi no laboratório?
Paciência, faço a viagem
Mesmo sentindo-me obtusa
Sem Musa nem repertório
E a sentir-me receosa
De as rimas trocar por prosa...
*
Mais uns passos. Vá, coragem!
Estes auto-incentivos
Vão soar-lhe caricatos
Foi, porém, por bons motivos
Que os usei nesta passagem
Cheia de pedras e matos...
Vai sendo extrema, a fadiga,
Mas, coragem, rapariga
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Que às raparigas velhotas
Chamam-lhes, os jovens, cotas...
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Mª João Brito de Sousa
24.03.2025
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7.
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Chamam cotas sem saber
Que o fazem sem sinais
De respeitar o vizinho
Há algumas doutorais
Que têm muito poder
De lhes mostrar o caminho
Não acertam, infelizes
Que são uns maus aprendizes
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Tivessem educação
E baixassem as orelhas
Tinham muito a ganhar
Viam que muitas das velhas
Têm muita informação
Para os poder ensinar
Nesta longa caminhada
Mas eles não sabem nada
*
Vir até Braga de Oeiras
Requer um voo pensado
Com muita arte e magia
Um percurso imaginado
E sem ter muitas canseiras
Mas com arte e poesia
Mas devem todos saber
Que só voa quem souber
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Que ter asas como a ave
Não é para toda a gente
Nem para rapaziada
Com falar tão indecente
Isso é só para quem sabe
Fazer esta caminhada
É melhor não lhes ligar
São garotos a asnear
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Cá a espero pelo Minho
Boa sorte no caminho
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Custódio Montes
25.3.2025
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8.
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Estou pr`aqui numa aflição
pois não sei onde arrumei
Um certo medicamento...
As voltas que pr`aqui dei
Tornaram-me o passo lento
E apressado o coração...
O pior é se olho em volta
E encontro o diabo à solta...
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Mas fique o demo tranquilo
Lá no espaço imaginário
Onde o fomos inventar:
Vou em sentido contrário,
Não o quero incomodar,
Nem irei pedir-lhe asilo...
Era só o que faltava,
Sentar-me entre enxofre e lava!
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Prossigo embora o dever
Me vá chamando à razão
Que quer que eu volte pra trás
Porque, sem medicação,
Fico mais cansada e... zás!
Corro o risco de morrer!
Onde será que arrumei
As pastilhas que comprei?
*
Ai, que agora está na hora
De injectar a insulina
Na minha velha Mistral,
A minha amiga felina
Que há onz`anos aqui mora
E que, agora, está tão mal...
Se me esqueço ou se me engano,
Não me dura mais um ano...
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Penso, escrevo e, de repente,
Tenho o Minho à minha frente!
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Mª João Brito de Sousa
25.03.2025
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