A CEIA DO POETA II - Reedição
Gravura de Manuel Ribeiro de Pavia
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A CEIA DO POETA II
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São cinco e meia da tarde,
Mas o Sol arde num grito
Sobre um esboço de infinito
Que espero que alguém me guarde,
Sem choros, nem grande alarde,
Sob um bloco de granito…
Espero, espero, mas… hesito,
Sabendo bem que o Sol arde,
Sei que me torno cobarde
Porque o fito ou quando o fito...
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Como não esperar de alguém
Essa mesma hesitação,
Quando eu, tendo esta paixão,
Chego a hesitar também?
E quem sabe o que lá vem
Desta humana condição,
Quando o que trai um irmão,
Também trai o pai, a mãe,
E tudo o que lhe convém,
Sem consciência da traição?
*
Nesta tarde, às cinco e meia,
Quanto ficou por nascer
Do que alguém tentou escrever?
Quanta estrofe é mera ideia?
Nos quadris de cada aldeia,
Quanto espanto por colher?
Que rimas, das de comer,
Sobram de um poeta, à ceia?
E, se já nada o refreia,
Quem é que o pára ao morrer?
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Maria João Brito de Sousa
15.04.2017 – 11.44h
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