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http://asmontanhasqueosratosvaoparindo.blogs.sapo.pt

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EIS AS MONTANHAS QUE OS RATOS VÃO PARINDO

por muito pequenos que pareçam ser... NOTA - ESTE BLOG JAMAIS SERVIRÁ CAFÉS! ACABO DE DESCOBRIR QUE OS DOWNLOADS SE PAGAM CAROS...

CENÁRIO(S)

27.06.20 | Maria João Brito de Sousa

cenários.jpg

CENÁRIO(S)

*

Anjos de asinhas de estanho

Mostram sorrisos rasgados

Em simetria traçados

E excessivos em tamanho.
*

Um dragãozinho comprado

No chinês, por baixo preço,

Exibe um corpo alongado

Sobre um tapete algo espesso.
*

Junto à janela da sala

De um vaso de dúbio gosto

Brota uma planta que exala

Um cheiro a mofo e a mosto.
*

De um gramofone impossível

Sob uns dois dedos de pó

Sai o som quase inaudível

De uma canção de dar dó.
*

O espaço que hoje visito,

Todo por mim concebido,

Não é feio nem bonito

E, se existe, está perdido
*

Num qualquer imaginário

Ou na remota memória

Do criador do cenário

De um palco morto e sem história.

*

 

 

Maria João Brito de Sousa - 26.06.2020 - 15.29h

ATÉ QUE A MORTE NOS SEPARE

25.06.20 | Maria João Brito de Sousa

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ATÉ QUE A MORTE NOS SEPARE
*
(décimas à minha Mistral)
*
I
*


Pra vos falar com franqueza,

A minha amiga Mistral

Continua a passar mal...

Que insustentável tristeza!

Depois de tanta despesa

E da ida ao hospital,

Não está nem a dar sinal

De se mostrar menos presa

À aflição que mais a lesa;

Uma comichão brutal!
*
II
*

E, depois da cortisona

Que é o anti-inflamatório

Mais potente e mais notório,

Como há-de valer-lhe a dona

Que não é tão sabichona

Quanto o é no seu empório

De carácter provisório

Com rimas na bujarrona?

Vou ao fundo? Venho à tona

De um drama em nada ilusório?
*
III
*

Pequenina companheira

E minha felina musa,

Doce Mistral de alma lusa

Em perpétua brincadeira!

Quanto pulas sem canseira

Caçando a sombra, confusa

Quando ela se te recusa

E te toma a dianteira

Da parede de madeira

Na qual a vês como intrusa...
*
IV
*

Até que a morte me leve

Vou fazer quanto puder

Para te não ver sofrer!

Se a vida me não for breve

Porque em poemas me deve

Quantos deitou a perder,

Até a voz me doer

Jurarei que não subscreve

Quem a tal esforço se atreve

Para viva te manter!
*

 


Maria João Brito de Sousa - 24.06.2020 -18.35h
*

 

PS - Desculpem-me estas décimas um bocadinho MUITO "lamechas", patéticas e excessivas. Também eu tenho as minhas fraquezas e a Mistral é uma delas. "Isto" é mesmo só o coração a falar de costas viradas para a razão...

ESPIRAL

23.06.20 | Maria João Brito de Sousa

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ESPIRAL
**
(Décimas)
*

I
*


Da espiral na qual me afundo

E em que lentamente expiro

Curva a curva, giro a giro,

Melhor enxergo este mundo,

Mais com a vida me fundo

Se daqui, do meu retiro,

Vou, de suspiro em suspiro,

Até Algés ou Dafundo,

A mil anos por segundo

Do tempo em que hoje me insiro.
*

II


*
Tantas horas, dias, anos,

Vão girando na espiral

Da minha vida real

De alegrias e de enganos

Entre animais e humanos

Que, uns por bem, outros por mal,

Vão deixando o seu sinal,

Ou mesmo causando danos,

Inocentes, que em seus planos

Não estava fazer-me mal.

*

III

*

Depois, em sentido inverso,

Roda a espiral. Traz consigo

Um pouco do tempo antigo

Em mil poemas disperso

E que vai da cova ao berço;

Monda o pasto, ceifa o trigo,

Quebra a noz, colhe-me um figo,

Restaura-me o velho terço

E, às vezes, deslinda um verso

Que eu quase sempre bendigo.
*

IV

*

Vai e vem, espiral, não pares

De rodar dessa maneira;

Faz-me girar toda inteira,

Vai aos meus ancestrais lares

E entrega-me o que encontrares

Da minha canção primeira...

Traz-me as chamas da lareira

E o sal das ondas-altares

Que ergui na abstracção dos mares

Em que me fiz marinheira!
*

 

Maria João Brito de Sousa - 23.06.2020 - 19.30h

 

 

BARCA, A BELA

22.06.20 | Maria João Brito de Sousa

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BARCA, A BELA

***

Fraca barca, a dos cuidados

De quem tema naufragar

Antes do verso galgar

Seus porões quase inundados!
*

Aporta, barca, ao teu cais,

Leva a alma até Almeida,

Escreve a tua própria Eneida

Na fúria dos temporais!
*


Fraca barca, a que afundar

Antes dos ventos irados

Destruírem seus costados

E o seu velame tombar!
*

Voa barca! Iça barqueiro

O cordame à bujarrona,

Mantém-me essa barca à tona

Da tinta do meu tinteiro!
*

Firma-te bem, timoneiro

Ao leme da barca bela

Que o vento que açoita a vela

É um verso passageiro!
*

Fracos sois, ó embarcados,

Se vos deixais afogar

Antes do verso deixar

Vossos estros inspirados!
*

 


Maria João Brito de Sousa - 22.06.2020 - 10.40h

EM TONS DE BOLERO

19.06.20 | Maria João Brito de Sousa

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EM TONS DE BOLERO
*

 

(décimas para "fintar" o cansaço)
*
I

*


Perdoem-me a piroseira

Dos abraços, dos beijinhos,

Dos excessivos carinhos

Que vos deixo em sementeira;

Sei bem quando faço asneira

Pois também eu tenho espinhos

Como as ervas dos caminhos

Ou as rosas da roseira

E que como a abelha obreira

Nunca ferro de mansinho...
*

II


*

Desculpem-me este exagero

De corações, de melaço...

Nem sequer sei porque o faço

Pois tudo aquilo que espero,

Já que no verso me esmero,

É dar-vos um forte abraço

Com quantos versos tempero...

Sei que o vosso tempo é escasso,

Mas finto o vosso cansaço

Compondo em tons de bolero.
*

 


Maria João Brito de Sousa - 19.06.2020 - 11.47h