MATA-BICHO
Hoje, à hora do costume,
Nem mais tarde, nem mais cedo,
Fui desvendando o segredo
De uma chaleira que, ao lume,
Vai exalando o perfume
Do café que me concedo...
Agora e todos os dias,
Como se consolo houvesse
Pr`a quem de tanto carece,
Encho as minhas mãos vazias
De estrofes das poesias
Que nunca sei quem me of`rece...
Sempre à hora do costume.
Nem mais tarde, nem mais cedo.
Amanhã... sei lá se acordo...
Mas... eu quero lá saber!
Enquanto puder escrever,
Gravo nos versos que mordo,
- com todo o prazer, recordo... -
O que mais me der prazer
E esta grata sensação
De ser moldada ao moldá-los
Faz com que, ao saboreá-los,
Esqueça o café no fogão,
Esqueça a fome e esqueça o pão
Com que devo alimentá-los...
Sempre à hora do costume
De um relógio que não pára...
Nem mais cedo, nem mais tarde,
Gasto a retina cansada,
Gasto-me e não gasto nada;
Não se apaga a chama que arde
Como a alma de um cobarde
Se apaga se for soprada!
Mas há sempre um estranho travo
No mais doce dos sabores
E, se há palavras com cores
Que florescem como um cravo,
Outras há que, num tom cavo,
Gritam e lançam estertores...
Todo o dia, a cada hora
Deste instante que passou...
Maria João Brito de Sousa - 18.02.2016 - 20.25h