DANDO UM ROSTO À VOZ QUE TENHO - Décimas
Que coisa eu fiz - ou não fiz… -,
Que às coisas que tenho feito
Juntasse nódoa ou defeito
Ou dissesse o que eu nem quis?
Do que o bom senso me diz,
Repito aquilo que aceito;
Ser e estar deste meu jeito
É que me torna feliz
Mesmo ferindo a cicatriz
De algum velho preconceito…
Nesta postura me privo
Duma “imagem” que convém
A quem fuja do desdém
De uns – poucos… - com quem convivo,
Mas, se um só ficar cativo,
A mim só me fará bem
Ir um pouco mais além
Sem prender-me ao velho arquivo;
Antes, num poema esquivo,
Dou rosto à voz que o contém!
Se frontalmente me assumo
Dando corpo à voz que tenho,
Se escrevo e nem me detenho
Nos planos de um novo rumo,
Se é tão pouco o que consumo,
Se outro rumo, sendo estranho,
Parecer franzir-me o cenho
Como se eu, mero resumo
Da tal “obra” em que me aprumo,
Fosse o que eu própria desdenho,
Por quê fingir-me dif`rente?
Pr`a quê “morna e colorida”
Se, directa e desabrida,
Digo tanto a tanta gente?
Pobre, mas nunca indigente,
Pardal bravo ou fera ferida,
Não procurarei, na vida,
Muito mais do que a semente
Que as mais das vezes faz frente
À aridez mais ressequida!
Maria João Brito de Sousa – 06.07.2014 – 18.33h